17.10.06

Quero uma casa com paredes azuis


William G. Hartshorn
Quero uma casa com paredes azuis,
com varandas vidradas sobre a noite.
Um abrigado lugar no eixo do silêncio.
Um espaço intemporal. Sagrado.
Ancorado perto de um signo lunar,
ou preso a um verão inesperado.
Quero dançar dentro das palavras líquidas:
água, rio, mar, lágrimas,
talvez o orvalho que escorre 

pelas árvores de madrugada.
Quero atravessar uma crónica de viagem,
conspirando contra os profetas 

de marés sobressaltadas,
para não morrer sufocada 

na engrenagem do medo.
Quero ficar seduzida de uma espera,
no imaginário dos que sonham
e gritar a idade circular de qualquer afecto.
Quero amar o pretexto branco dos meus olhos,
sem precipitar a cor translúcida das raízes
que prendem a noite à palidez do sol, 

na sedução do amanhecer
e deixar, depois, que um azul 

extenuado me denuncie.

Graça Pires
De Conjugar afectos, 1997

2 comentários:

Alexandre Bonafim disse...

Graça, o azul desse poema nos faz habitar essa casa espelhada no infinito. Suas palavras densificam nosso coração. Grande beijo do Alexandre Bonafim.

Agostinho disse...

Viva, Amiga Graça,
obrigado pelo sentido delicado da brisa que dissipa cúmulos.
Em breve abelhas voarão de flor em flor.
nesse azul, este Sol!...
O azul é refúgio seguro, até
o instinto verde do soldado
se quer livre do medo farpado.
Querer e o azul anunciado
não é pecado...

Bj.